domingo, 19 de maio de 2019
MPF discute ações contra intolerância religiosa no Rio
O MPF vai discutir
com o governo do estado do Rio de Janeiro e o município de Nova Iguaçu, na
Baixada Fluminense, medidas de combate à intolerância religiosa
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HÁ 17 HORAS POR NOTÍCIAS AO MINUTO
BRASIL BAIXADA FLUMINENSE
OMinistério Público Federal (MPF) organiza uma reunião aberta, em 30 de
maio, para discutir com o governo do estado do Rio de Janeiro e o município de
Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, medidas de combate à intolerância
religiosa. Entre elas, estão ações de valorização da cultura africana e
afro-brasileira nas escolas, a imunidade tributária a terreiros, acolhimento
das vítimas e a repressão a grupos criminosos que atacam sacerdotes, terreiros
e adeptos de religiões afro.
O evento é um desdobramento da audiência pública
realizada em 6 de maio. Na ocasião, o governo do estado já se comprometeu com o
MPF a financiar um serviço de atendimento de orientação jurídica e
psicossocial, em parceria com a prefeitura, por meio da Secretaria de estadual
de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos.
O MPF tem inquérito civil público aberto para
investigar a intolerância religiosa em Nova Iguaçu, um dos municípios que mais
registraram episódios de violência no estado nos últimos anos, segundo dados da
própria Secretaria de Direitos Humanos. No último domingo (12), Dia das Mães,
um terreiro de candomblé, aberto há 15 anos no bairro Parque Flora, pela
terceira vez foi invadido. Traficantes, apontados por frequentadores como os
invasores, fizeram um churrasco no local. Antes, em março, eles já tinham pichado
a frase “Jesus é dono do lugar” e destruídos objetos.
O episódio não é um caso isolado. O crime
organizado nos bairros mais pobres de municípios da Baixada, somado à
intolerância, tem se tornado uma ameaça à liberdade religiosa, afirmam
lideranças ouvidas pela Agência Brasil. Por causa desses ataques,
no fim de 2018, o então Ministério de Direitos Humanos chegou a divulgar Nota
Pública de Repúdio, denunciando agressões feitas pelos “traficantes jesus”,
identificados como neopentecostais.
Ações coordenadas do Poder Público, em todas as
esferas, são soluções apontadas para acabar com os ataques e enfrentar o
preconceito, segundo o Relatório Intolerância Religiosa no Brasil, do
Laboratório de História das Experiências Religiosas da Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ) e da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa do Estado
do Rio (CCIR), lembra o babalaô Ivanir dos Santos, interlocutor da comissão.
“Um dos caminhos é a investigação dos casos pela
Polícia Civil e campanhas que “deixem claro: a intolerância não será admitida”,
acrescenta a ativista e ekedi do terreiro Ilê Omi Oju Arô, de Mãe Beata de
Iemanjá, Lúcia Xavier.
“Antes, a religião era proibida, atacada pelo
Estado, reprimida pela polícia. Alegavam que era reduto de marginais para
reprimir. Ocorre que agora, nos últimos anos, essa intolerância tem a ver com
os fundamentalistas de origem pentecostal e que encontram aquiescência do
Estado”, afirmou.
Segundo Lúcia, que é também coordenadora da
organização não governamental Criola, “a experiência institucionalizada, da
violência contra os terreiros, indica que a não há preocupação do Estado em
enfrentar verdadeiramente o racismo por trás dos ataques”.
Em Nova Iguaçu, outra forma de enfrentar os
ataques, de acordo com os religiosos, é por meio da urbanização dos bairros
pobres. A localização de terreiros, em áreas de difícil acesso, sem esgoto,
iluminação ou pavimentação deixa os templos vulneráveis, afirma Roberto Braga,
sacerdote do Lumujacarê Junçara. “Aqui, em volta de 90% das igrejas evangélicas
e católicas, a rua é cuidada, não tem vala na porta, não tem esgoto, tem luz,
tem jardim”, disse. “Queremos a mesma dignidade, até para a própria população
não nos marginalizar. Não falo nem de asfalto porque, para asfalto chegar, vai
demorar muito. Eu falo é de trator, de menos lama”.
Além de ampliar o atendimento a vítimas com
apoio do governo do estado, nas audiências com o MPF, a prefeitura de Nova
Iguaçu se comprometeu com ações de valorização dessas religiões. Entre elas, a
organização de um cadastro das casas religiosas iguaçuanas – que chegou a ser
feito em 2008, mas foi perdido, e a elaboração da lei municipal de isenção
tributária.
O Ministério Público quer avançar ainda mais na
cultura, antecipa o procurador da República responsável pelo caso, Julio José
Araújo. “Na cultura, infelizmente, [o diálogo] está frágil, a pasta está pouco
solícita, julgando que a pauta é só de segurança”. De acordo com o procurador,
no entanto, as medidas de combate à intolerância religiosa devem ser
intersetoriais. “O MPF considera que, obviamente, devemos ter diálogo com a
segurança pública, mas esse não pode ser um fator impeditivo para políticas
públicas de outras áreas”.
O coordenador de patrimônio imaterial da
Secretaria de Cultura de Nova Iguaçu, Geraldo Bastos, explica que o município
“tem um componente mais problemático: os chamados traficantes jesus”, ligados a
religiões neopentecostais. “Não é uma questão que conseguimos sozinhos
resolver”, disse. “Sem o braço do governo do estado, esse problema, que atinge
todo o Rio, não terá o devido tratamento”. Ele também pede envolvimento de
outros seguimentos religiosos.
Na área de segurança, a aproximação é mais
lenta, admite o coordenador de Promoção da Liberdade Religiosa, da Secretaria
de Direitos Humanos do estado, o escritor Márcio de Jagun. “Esse é um setor
bastante complexo porque é preciso identificar, em cada região, as áreas
conflagradas, as peculiaridades dessa intolerância. Em Nova Iguaçu, por
exemplo, os casos são extremamente violentos e envolvem, além do tráfico de
drogas e milícias, a grilagem de terras”.
Em nota, a Polícia Militar (PM) disse que “os
batalhões realizam o patrulhamento dinâmico, atendendo ocorrências e também o
policiamento em locais onde a mancha criminal é acentuada”. Procurada, a Polícia
Civil não respondeu à Agência Brasil até a divulgação desta matéria.
Como parte das atividades que discutem o impacto
da intolerância na vida dos religiosos, está prevista para sexta-feira (24) uma
oficina da Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (Renafro). O
evento será no Ilê Omolu Oxum, em São João de Meriti, também na Baixada
Fluminense.
Para denunciar atos de intolerância religiosa,
vítimas e testemunhas podem discar 100, serviço do governo federal que funciona
24 horas, ou (21) 2334-9550, número do Disque Combate ao Preconceito, vinculado
ao governo do estado do Rio.
Interessados na reunião do MPF com gestores
públicos podem se inscrever enviando e-mail
para prrj-sjm-gaboficio3@mpf.mp.br ou pelo número (21) 2753-7918.
Com informações da Agência Brasil