TJ: É
POSSÍVEL CRIME DE EXTORSÃO POR AMEAÇA ESPIRITUAL
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A ameaça supersticiosa, isto é, aquela que se refere a uma crendice, simpatia ou
macumba (item nº 26).
Recentemente, a Sexta Turma do Superior Tribunal de
Justiça, de forma unânime, decidiu, sob relatoria do Ministro Rogerio Schietti
Cruz, no REsp 1299021, que a ameaça de emprego de forças espirituais para
constranger alguém a entregar dinheiro é apta a caracterizar o crime de
extorsão, mesmo que não haja violência física ou outra forma de ameaça.
Transcrevo parte da ementa:
[…]
3. A alegação de ineficácia absoluta da grave ameaça de mal espiritual não pode
ser acolhida, haja vista que, a teor do enquadramento fático do acórdão, a
vítima, em razão de sua livre crença religiosa, acreditou que a recorrente
poderia concretizar as intimidações de “acabar com sua vida”, com seu carro e
de provocar graves danos aos seus filhos; coagida, realizou o pagamento de
indevida vantagem econômica. Tese de violação do art. 158 do CP afastada.
[…]
(REsp 1299021/SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em
14/02/2017, DJe 23/02/2017)
No caso analisado, a vítima teria contratado a
acusada para realizar trabalhos espirituais de cura. Posteriormente, a vítima
passou a se recusar a dar mais dinheiro pelos serviços, momento em que a
acusada teria, segundo a denúncia, exigido 32 mil reais para desfazer “alguma
coisa enterrada no cemitério” contra os filhos da vítima. Também teria dito que
“agiria em nome de espíritos”. Por esse fato, o STJ considerou a prática do
crime previsto no art. 158 do Código Penal.
O relator considerou que para a vítima e boa parte
da população brasileira existe a crença na existência de forças espirituais, motivo
pelo qual a atitude imputada à ré seria capaz de gerar intimidação.
Essa decisão não significa, obviamente, que
qualquer “ameaça espiritual” contra qualquer pessoa constitui ameaça para fins
penais. Na verdade, o STJ considerou que, nesse caso concreto, a ameaça
espiritual possuía eficácia em razão do fato de a vítima ter pago os valores
exigidos mediante constrangimento. O pagamento, que seria mero exaurimento do
crime de extorsão (classificado como crime formal), demonstraria que a vítima
teria se sentido intimidada.
A ameaça, como crime (art. 147 do Código Penal) ou
elemento de outro crime (por exemplo, os arts. 146, 157 e 158 do Código Penal),
não pode ser aferida abstratamente, porquanto necessária a sua capacidade de
causar temor à vítima.
Assim, a ameaça espiritual, por si só, não causaria
temor indistintamente a toda e qualquer pessoa. A controvérsia surge quando se
tenta definir qual é o critério utilizado para balizar se há ou não
intimidação.
Poder-se-ia adotar, como pretendido pela defesa nesse
caso julgado pelo STJ, o critério do “homem médio”, ou seja, uma análise
objetiva do que outras pessoas teriam sentido – intimidação ou indiferença –
após ouvirem as afirmações que teriam intimidado a vítima. Nesse contexto, não
seriam consideradas as crenças da vítima. Ademais, a defesa argumentou que o
meio utilizado seria absolutamente ineficaz para a finalidade de concretizar
uma ameaçar.
Por outro lado, há quem defenda que deve ser
considerada a condição subjetiva da vítima, desconsiderando o critério do
“homem médio”. Adotando esse critério, seria evidente que no caso julgado pelo
STJ as ameaças espirituais constituiriam ameaça para fins penais, porque a
vítima acreditava em forças espirituais, razão pela qual, inclusive, havia
procurado a acusada para promover cura espiritual.
De qualquer sorte, trata-se de um tema que merece
maior atenção acadêmica, a fim de evitar que sejam adotados critérios distintos
(objetivo ou subjetivo) de forma casuística.