“Numa sociedade hodierna, onde a necessidade preeminente de externar cada vez mais opiniões, preceitos e imposições aos outros é ascendente, a carência de um recolhimento intrínseco fica aquém.
Grita-se para mostrar o seu poderio. Alarde -se com estridente voz a sua força para com os subjugados.
A religiosidade africana,em sua milenar estrutura mítica, traz-nos um modelo singelo de reflexão, baseado no silencio de um broto que germina solitariamente na terra. Seu nome confunde-se com o silencio da força da natureza que o ser humano mais teme- a morte. Obaluayê, Savalú,Omulu, Xapanã, Ajunsú ou Sakpatá, filho de Nanã Buruquê (senhora da lama,do lodo,do pântano e guardiã do portal entre o ayê e orum) e Oxalá ( orixá da paz, inicio do fim).
Vestido com seu filá (palha da costa) tendo a sua mão o xaxará (cetro)envolto em búzios e o corpo coberto de varíolas, pestes,chagas e todas sorte de doenças. Orixá bastante temido nos rituais de candomblé, mas extremamente respeitado por possuir os segredos da cura da enfermidades que assolam o corpo e alma humana.
Omulu na sua forma mais velha tem um grande poder sobre os eguns (espíritos desencarnados) e ancestrais. Esse inkise é o encantamento da própria morte. Após a passagem do homem para outro plano, é Obaluayê o responsável pela limpeza do corpo, permitindo que aquele que falecera se desprenda do plano terreno.
O grande rei, senhor da terra, cujo nome evita-se inclusive pronunciar sem motivo real, tem um ligação com a mesma. Da terra advém o retorno, feito karma que se paga por erro cometido. Também o pó numa representatividade de nossa mais profunda e irrestrita fragilidade e limitação humana.
Dele (Omulu) provém a transformação, onde o corpo em avançado estado de putrefação decompõe-se tornando-se tão somente nada. E finalmente o renascimento, dando a possibilidade de continuar -mos nossa jornada mostrando que a vida é um ciclo, onde nascemos para morrer e morremos para renascer, tantas vezes quanto for preciso, até cumprir -mos nossa missão.
Atotô meu Pai, senhor da vida e da morte.”
Por Olegário Venceslau, escritor, poeta, acadêmico de Direito, membro do Portal do poeta brasileiro e sócio da Academia Brasileira de Poesia –Rio de Janeiro
COMENTÁRIO
E nós seres humanos, nesse afã de querer viver cada vez mais intensamente, muitas e na maioria das vezes, impomos ao nosso corpo, que é morada desse grande vodum, toda sorte de desrespeito tais como: o fumo, a bebida alcoólica, os vícios das drogas proibidas, as noites mal dormidas, a alimentação de péssima qualidade ou em demasia, o exacerbamento sexual, enfim, desrespeitamos este invólucro chamado corpo diuturnamente. E quando nos advém às enfermidades, é que nos lembramos que existe deus e omolu, é quando nos lembramos de rezar, de rogar, e de pedir clemência e cura para as nossas dores e chagas. É quando nos lembramos que existem padres, pastores, zeladores de orixá entre outros. Porque nesses momentos, já não podemos mais nos dar o desfrute de impor ao nosso corpo (morada sagrada), tantas imperfeições comportamentais.
Porém, o amor que nos dedica esse grande vodum, é tão grande, que acabamos por receber a graça da cura, às vezes não na sua totalidade, por que depende muito do merecimento e carma de cada um. Mas, já está de bom tamanho. Atôtô Ajuberu Omulu, Obailuyê Xapanã!