sexta-feira, 10 de setembro de 2010

O Tambor de Mina e o seu Culto de São Cosme e São Damião


O Tambor de Mina e o seu Culto de São Cosme e São Damião No Culto Mina as entidades que descem normalmente são crianças. Porém, na Casa Nagô, somente as Meninas Princesas, são incorporadas pelas Vodunsis Na Casa Nagô, um Terreiro de Tambor de Mina, de Culto Afro-Maranhense, e que existe há cerca de 200 anos, fundada por escravas africanas, acontece a festa dedicada a São Cosme e Damião. Alguns estudiosos informam que o espaço é mais antigo do que o da Casa das Minas. A festa normalmente é ligada à devoção que as pessoas têm com os santos católicos e na Casa Nagô ela é tradicional, pois há muitos anos uma senhora começou a pagar uma promessa feita em razão de graça alcançada para dois filhos seus que eram gêmeos, surgindo daí a comemoração.

A festa atrai muitas entidades infantis, as chamadas Meninas, como são denominadas no culto. “Aqui, no caso, as meninas representam Princesas que ainda vêm na Casa. Esta festa não é muito ritualizada, é uma coisa devocional, as pessoas que têm uma promessa trazem bombons, outras fazem bolos. No dia dedicado aos santos, existe a preparação dessas comidas pela parte da manhã. Os bombons e os bolos são colocados em saquinhos para serem distribuídos para as crianças, e aí então o grupo se reúne para o serviço”, informa Sebastião Cardoso Júnior, pesquisador ligado à Casa. As pessoas ligadas ao Terreiro também se encontram nesse dia para um almoço compartilhado, no qual são servidas comidas comuns de festas. Nesta comemoração, porém, além de outros pratos, é servido o Caruru, comida tradicional da Casa, servida em cerimônias, e muito ligado à festa de São Cosme e Damião.

Durante a comemoração, ao meio-dia, costuma-se rezar uma ladainha para Nossa Senhora, oferecida aos santos do dia. Em seguida, o hino de São Cosme e Damião é entoado. Nesse momento normalmente acontece a incorporação, o transe de algumas filhas de santo. No dia 27 de setembro, durante o cântico, três Vodunsis ( como são denominadas as dançantes, no Tambor de Mina) incorporam Entidades: Iemanjazinha ou Janaína, a Princesa Linda ( que tem no dia 16 de outubro uma festa só para ela). As Vodunsis que receberam incorporação foram ajudadas e apoiadas por outras dançantes. A partir daí, são crianças, nos gestos nas falas, e permanecem durante longo tempo brincando com suas bonecas. As entidades ficam incorporadas durante o tempo que quiserem. O grupo de integrantes da Casa fica reunido em torno das Vodunsis que incorporam as Princesas e a elas é dedicada atenção especial, “pois são entidades infantis que precisam de muito trato para não se zangarem, não ficarem tristes, pois têm sensibilidade à flor da pele. Então, tudo é um choro e o cuidado é dobrado com essas entidades. Como são filhas de reis, nós precisamos recebê-las muito bem na Casa”, complementa Sebastião Júnior.

No ritual, no toque do Tambor, e também em situações que acontecem fora do toque, como neste caso, quando as Vodunsis incorporam, elas usam uma toalha em volta da cintura, denominada de Alá, que é um adereço que funciona como uma espécie de proteção das Entidades em relação às energias negativas do mundo. Como as Entidades são entendidas como seres divinizados, eles precisam dessa proteção. Após a ladainha, na entrada da Casa, entre o corredor e a entrada do Salão do Altar católico, dezenas de crianças se postam em fila para receber as guloseimas.
À medida em que outras crianças vão chegando, em horários diversos, cada uma delas vai recebendo seus saquinhos com bombons e bolo. Segundo a Marinalva A. Santos, Vodunsi da Casa, “a festa de São Cosme e Damião mudou porque quando eu caí aqui na Casa, ainda na época de dona Rosalina (uma das mais fortes líderes da Casa, última Vodunsi que tinha sido escrava, falecida em 1973 aos 107 anos), a festa começava às 10 horas da noite e amanhecia o dia seguinte. A distribuição de bombons durava o dia inteiro, também se distribuía brinquedo, até mingau se dava para as pessoas que vinham aqui, panelas e panelas de mingau aí para dar, o dia todo”.

A imagem de São Cosme e Damião é uma imagem antiga, e fica guardada no quarto de segredos, no Valdencó ou Pegi, lugar onde fica localizado o principal assentamento do Terreiro. Determinadas imagens, só saem do Pegi por ocasião do seu dia. A Casa Nagô ainda celebra com devoção as datas dedicadas aos seus santos, sincretizados com os Voduns de origem africana. No caso específico de São Cosme e Damião, no Culto Mina, as entidades que descem normalmente são crianças. Na Casa Nagô, porém, somente as meninas, as princesas, são tradicionalmente incorporadas pelas Vodunsis.

Durante o tambor, os filhos parecem cansados, pois as festas públicas são precedidas por obrigações sacrificiais que freqüentemente viram a noite, mas também sempre parecem contentes. E quando os tambores tocam e as entidades chegam, eles são capazes de dançar por muitas horas sem descanso. As crianças “vivas”, muitas, estão sempre presentes. Entram na roda, tocam tambor, correm de lá para cá, conversam com os Encantados. E têm sua predileções entre os Caboclos e Voduns. Elas vão sendo socializadas no cotidiano da Mina e aprendendo os ritos como aprendem tudo o mais.

Já na Casa das Minas, não se tem a informação de festas específicas sincretizadas com São Cosme e Damião. Entretanto, existem os Voduns jovens chamados Toqüéns ou Toqüenos, que cumprem a função de guias, mensageiros, ajudantes dos outros Voduns. São eles que “vêm” na frente e chamam os outros. Têm cerca de quinze anos de idade, podendo ser masculinos ou femininos, pertencendo a maioria, à família de Davice. Nos clãs de Quevioçô e Dambirá são os Voduns mais jovens que desempenham esse papel. Além dos Voduns, fazem parte do panteão da Casa das Minas, as Tobóssis, divindades infantis femininas, consideradas filhas dos Voduns, recebidas pelas dançantes com iniciação plena, as chamadas Vodúnsi-Gonjaí. As princesas meninas não vêm mais na Casa das Minas. Com a morte das últimas Vodúnsi-Gonjaí, parte do processo de iniciação se perdeu, de modo que as dançantes remanescentes não tiveram iniciação no grau de Gonjaí, de senioridade. E as Tobóssis não vieram mais na Casa das Minas. Diferentemente dos Voduns, que podem manifestar-se em diferentes adeptos, a Tobóssi, na Casa das Minas, é considerada entidade única, exclusiva de sua Vodúnsi-Gonjaí, e que desaparece com a morte da dançante que a recebia, não se incorporando depois em mais ninguém.

Prandi/ R. – Nas pegadas do Vodun
Templo Et Xauri
Jornal Pequeno