sexta-feira, 26 de março de 2010

Terreiro “Pilão de Prata” notificado pela SUCOM


Mais um caso de Intolerância Religiosa em Salvador - BA
O Ilê Odô Ogê, conhecido como “Pilão de Prata”, situado na cidade de Salvador (BA), foi visitado por um fiscal da Superintendência de Controle e Ordenamento do Solo Urbano do Município de Salvador (SUCOM), que notificou a comunidade pelo barulho provocado pelos “instrumentos de percussão”, referindo-se aos atabaques, frisando inclusive, que não entendia nada, estava ali apenas cumprindo o seu papel de fiscal. Fez algumas perguntas sobre o tipo de instrumentos que a comunidade utilizava, e explicou que a sua visita não tinha nenhum caráter punitivo, apenas a intenção de averiguar os espaços e instrumentos que levaram um anônimo a denunciar o templo religioso. O responsável pela comunidade, Sr. Vilson Caetano de Sousa Júnior, solicitou ao fiscal que lesse o texto “O terreiro e o barulho na cidade”, publicado no Jornal “A Tarde”: “Achei até uma coincidência após tal provocação receber a visita de um representante do órgão que regula dentre outras coisas, sons urbanos, fixa níveis e horários em que é permitido sua emissão e cria licença para utilização sonora. Coincidência ou não, fato é que aquele jovem fiscal estava ali representando a Lei 5354/98.”

Sr. Vilson apresentou ao fiscal uma resumida história daquela Roça de Candomblé, que se originou em 1963, quando o atual “morro do Cachundé” era apenas uma duna e abaixo havia a lagoa utilizada pelas poucas pessoas para lavar roupas e por alguns terreiros, dentre eles, o “Pilão de Prata” para realizar alguns rituais, assim como, que tal Comunidade de Terreiro já havia sido tombada pelo Instituto de Patrimônio Artístico Cultural da Bahia em 9 de dezembro de 2004, sem falar nos Decretos Lei Municipal e Estadual que o reconhece como Utilidade Pública. Diversas instalações foram apresentadas, entre elas o Museu, a Biblioteca e a Escola que aguarda a dois anos financiamento para realização de atividades. Nada adiantou, ele tinha que retornar com seu dever cumprido e baseado no Artigo 6 da Lei 5354/98 notificou a Comunidade de Terreiro com o seguinte texto: “O responsável pelo estabelecimento supra-citado fica ciente que a emissão sonora gerada em atividades não residenciais, somente poderá ser efetuada após expedição pelo órgão competente da Prefeitura do Alvará de autorização para utilização sonora.”

Segundo Sr. Vilson, “Isso me trouxe a lembrança dos tempos terríveis de Pedrito, que nunca saíram da memória do Povo de Candomblé. Mais uma vez salta os olhos que tais órgãos que deveriam estreitar relações com a cidade seja liderado por dirigentes mal assessorados que no mínimo deveriam saber interpretar a Lei 5354/98 que diz no inciso IV do Capítulo 14 que ‘não estão sujeitas às proibições referidas nesta Lei o sons produzidos por sinos de igrejas e de templos religiosos desde que sirvam exclusivamente para indicar as horas ou anunciar a realização de atos ou cultos religiosos.’ Por que então, dois pesos e duas medidas? Por que uma vez por ano não podemos tocar os nossos clarins e atabaques, tocar nossos foguetes para anunciar a realização de nossos atos e cultos religiosos? O que dizer então das alvoradas festivas de outras denominações religiosas realizadas as 5 horas, ao raiar do dia?”

O Ilê Odô Ogê está entre os 1068 terreiros mapeados através de um trabalho pioneiro no Brasil, resultado da parceria entre a Prefeitura Municipal de Salvador, através da Secretaria de Reparação (SEMUR) e da Secretaria Municipal de Habitação (SEHAB), o Ministério da Cultura, através da Fundação Cultural Palmares e a Secretaria Especial de Promoção de Políticas para a Igualdade Racial (SEPPIR) em convênio com a Universidade Federal da Bahia através do Centro de Estudos Afro-orientais (CEAO). Teria o catálogo elaborado, sido consultado? A notificação 410703 de 18 de março de 2010 parece estar equivocada, o que pode levar diversos templos religiosos em todo o país, a episódios desastrosos pelos quais já passaram outras Comunidades de Terreiros, tais como demolição, cobrança indevida de IPTU, e outros O fato é que, o que aconteceu com o “Pilão de Prata”, poderia acontecer em qualquer outro Templo. “De uma coisa temos a certeza: esta luta será travada juntamente com todos os Orixás, Nkices, Caboclos e Guias. Avante!!!”


Fonte:Vilson Caetano de Sousa Júnior - Pós Doutor em Antrolopologia, professor da Escola de Nutrição da UFBA, membro do Conselho de Cultura do Estado da Bahia e Omo Orixá do Ilê Odo Ojê.