quarta-feira, 24 de novembro de 2010
Estudo mostra casos de vingança de escravos contra seu proprietário
Transcrição de textos citados no Paulopes Weblog ou sugeridos para leitura
terça-feira, 16 de novembro de 2010
Estudo mostra casos de vingança de escravos contra seu proprietário
por Ricardo Mioto da Folha
Os senhores do Brasil escravocrata eram tão confiantes na submissão dos seus escravos que, com frequência, acabam assassinados por falta de tato ao lidar com eles.
A conclusão é da historiadora Maíra Chinelatto Alves, cujo mestrado recém-completado na USP é sobre isso.
Ela conta, por exemplo, o caso do velho Pedro Antônio Oliveira, mais de 80 anos, de Campinas. Em 1845, irritado, teve a genial ideia de ir sozinho atrás de um dos seus 15 escravos, João de Nação, negro forte com menos de 30 anos, para castigá-lo.
Em uma cena digna de filme B de ação rodado no Terceiro Mundo, o velho e o negro se encontraram no meio de um bananal. Oliveira deu uma paulada na cabeça de João, que reagiu com uma foice, matando o seu dono.
Em sua defesa, João disse que tinha tomado "algumas pingas" e que "ainda andava meio quente delas".
Com frequência, diz Chinelatto, os donos achavam que seus escravos faziam corpo mole e desciam o sarrafo para acabar com isso.
Os mais ricos tinham intermediários, como capatazes, responsáveis por lidar com os escravos. O senhor, então, conseguia ficar mais distante. "Mantinha até uma imagem paternalista de senhor justo, a quem os cativos podiam recorrer", diz Chinelatto, que estudou processos criminais da época.
Mas proprietários mais pobres, como Oliveira, não tinham como manter intermediários. "Não existia só aquele senhor que a gente vê em novela, com vários capatazes. Todo mundo tinha escravos, mesmo que poucos." Senhores mais pobres tinham de se misturar aos escravos.
Outro deles era João Lopes de Camargo, também de Campinas. Num dia de 1847, foi até a roça e achou o serviço mal feito. Por isso, chicoteou o escravo Matheus.
Ele reagiu, derrubando Camargo, que caiu de bruços. Mateus batia com um pedaço de pau, enquanto seu colega Venâncio atacava de enxada.
Enquanto apanhava, segundo o depoimento de uma escrava, Camargo pedia a Matheus "que pelo amor de Deus não lhe matasse", prometendo-lhe a liberdade.
Matheus: "Quando você está surrando minha mulher, não se lembra de carta de liberdade. Por isso hei de matar você, mulher e filhos".
Conseguiu matá-lo e correr para matar sua mulher, mas foi impedido por vizinhos que foram ver o que acontecia -o que mostra que a fazenda de Camargo, de fato, não era tão grande.
Um terceiro proprietário, Antônio Pinto da Silva, foi morto em 1849 depois de esbofetear um escravo que, "de modo arrogante", disse que não podia comer angu pois "isso lhe faria mal à barriga".
A punição para os escravos assassinos mudou com o tempo. No começo do século 19, a regra era a pena de morte. Com o final da escravidão se aproximando, as penas foram ficando mais brandas.
Era um sinal de que mesmo a Justiça começava a achar aceitável certa revolta contra a escravidão. Além disso, há um motivo menos ideológico: com o fim do tráfico, escravos ficaram caros, e não se mata algo valioso.
É difícil saber exatamente quantos casos aconteceram: processos podem ter se perdido, e a própria Justiça ainda estava se consolidando.
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terça-feira, 16 de novembro de 2010
Estudo mostra casos de vingança de escravos contra seu proprietário
por Ricardo Mioto da Folha
Os senhores do Brasil escravocrata eram tão confiantes na submissão dos seus escravos que, com frequência, acabam assassinados por falta de tato ao lidar com eles.
A conclusão é da historiadora Maíra Chinelatto Alves, cujo mestrado recém-completado na USP é sobre isso.
Ela conta, por exemplo, o caso do velho Pedro Antônio Oliveira, mais de 80 anos, de Campinas. Em 1845, irritado, teve a genial ideia de ir sozinho atrás de um dos seus 15 escravos, João de Nação, negro forte com menos de 30 anos, para castigá-lo.
Em uma cena digna de filme B de ação rodado no Terceiro Mundo, o velho e o negro se encontraram no meio de um bananal. Oliveira deu uma paulada na cabeça de João, que reagiu com uma foice, matando o seu dono.
Em sua defesa, João disse que tinha tomado "algumas pingas" e que "ainda andava meio quente delas".
Com frequência, diz Chinelatto, os donos achavam que seus escravos faziam corpo mole e desciam o sarrafo para acabar com isso.
Os mais ricos tinham intermediários, como capatazes, responsáveis por lidar com os escravos. O senhor, então, conseguia ficar mais distante. "Mantinha até uma imagem paternalista de senhor justo, a quem os cativos podiam recorrer", diz Chinelatto, que estudou processos criminais da época.
Mas proprietários mais pobres, como Oliveira, não tinham como manter intermediários. "Não existia só aquele senhor que a gente vê em novela, com vários capatazes. Todo mundo tinha escravos, mesmo que poucos." Senhores mais pobres tinham de se misturar aos escravos.
Outro deles era João Lopes de Camargo, também de Campinas. Num dia de 1847, foi até a roça e achou o serviço mal feito. Por isso, chicoteou o escravo Matheus.
Ele reagiu, derrubando Camargo, que caiu de bruços. Mateus batia com um pedaço de pau, enquanto seu colega Venâncio atacava de enxada.
Enquanto apanhava, segundo o depoimento de uma escrava, Camargo pedia a Matheus "que pelo amor de Deus não lhe matasse", prometendo-lhe a liberdade.
Matheus: "Quando você está surrando minha mulher, não se lembra de carta de liberdade. Por isso hei de matar você, mulher e filhos".
Conseguiu matá-lo e correr para matar sua mulher, mas foi impedido por vizinhos que foram ver o que acontecia -o que mostra que a fazenda de Camargo, de fato, não era tão grande.
Um terceiro proprietário, Antônio Pinto da Silva, foi morto em 1849 depois de esbofetear um escravo que, "de modo arrogante", disse que não podia comer angu pois "isso lhe faria mal à barriga".
A punição para os escravos assassinos mudou com o tempo. No começo do século 19, a regra era a pena de morte. Com o final da escravidão se aproximando, as penas foram ficando mais brandas.
Era um sinal de que mesmo a Justiça começava a achar aceitável certa revolta contra a escravidão. Além disso, há um motivo menos ideológico: com o fim do tráfico, escravos ficaram caros, e não se mata algo valioso.
É difícil saber exatamente quantos casos aconteceram: processos podem ter se perdido, e a própria Justiça ainda estava se consolidando.
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